Em que pese se reconhecer que o novo Congresso foi o mais renovado dos últimos 20 anos, será o mais conservador em 40 anos.
Antônio Augusto de Queiroz*
A eleição do último dia 7 de outubro renovou em 52% a Câmara e 85% o Senado. O novo Congresso Nacional será mais liberal na economia, mais conservador nos costumes e mais atrasado em relação aos direitos humanos e ao meio ambiente do que o atual. Organizado em torno de bancadas informais — como as evangélicas, a da segurança/bala e a ruralista — será o mais conservador desde a redemocratização.
Neste pleito, a rejeição ao sistema político e às suas práticas foi devastadora. Mesmo os deputados e senadores tendo elaborado regras para assegurar suas reeleições — como a janela partidária, o fundo eleitoral e a redução do tempo de campanha e de propaganda eleitoral — a onda da renovação foi avassaladora.
Em que pese se reconhecer que o novo Congresso foi o mais renovado dos últimos 20 anos e que terá mais jovens, mais mulheres, mais negros, mais parlamentares conectados às redes sociais, terá mais estreantes ou em 1º mandato no Poder Legislativo Federal e será mais instruído que os anteriores, pode-se afirmar, com segurança, que será o mais conservador dos últimos 40 anos.
A renovação, como regra, é saudável, porque a alternância no poder é um dos principais pilares da democracia. Entretanto, como a motivação dessa renovação foi mais de rejeição aos atuais detentores de mandatos (bons e ruins) e menos de substituição qualitativa — com escolhas baseadas em critérios, propostas, trajetórias política e profissional dos candidatos — há sérias dúvidas sobre a qualidade dos eleitos. Apenas para ilustrar essa preocupação, basta dizer que a maioria absoluta dos novos foi eleita por ser liderança evangélica, policial linha dura, celebridade ou parente de políticos tradicionais. Ademais, foram eleitos alguns expoentes da “nova direita”, cujo único cabedal é terem liderado movimentos antipolítica, negando a validade do próprio sistema político-eleitoral.
Talvez o fato de a eleição ter se dado num ambiente conflagrado, a renovação tenha deixado muito a desejar em termos qualitativos, embora tenha sido grande do ponto de vista quantitativo. Muitos dos “novos” não têm a menor noção do que são, o que fazem e como funcionam as instituições do Estado. Boa parte imagina utilizar o mandato para se vingar do que, equivocadamente, consideram os inimigos da família, da pátria e da probidade, ou para defender o Estado mínimo.
A Câmara em números
Em termos numéricos, dos 513 deputados eleitos em 7 de outubro de 2018, 269 são novos ou não estavam no exercício do mandato, 244 foram reeleitos e 253 irão exercer seu 1º mandato na Câmara dos Deputados. Dos 407 deputados que tentaram a reeleição, 163 não lograram êxito, tendo sido derrotados. Dos 269 considerados “novos”, 128 já têm experiência anterior como agente político — eleito ou nomeado para função de confiança — e 141 nunca exerceram nenhuma função política anterior.
No Senado, o fenômeno foi ainda mais intenso. Dos 54 senadores em final de mandato, apenas 8 conseguiram renovar seus mandatos; 46 serão novos ou não estavam no exercício do mandato. Desses, pelo menos 9 nunca exerceram nenhum cargo político, nem no Executivo nem no Legislativo.
Quanto ao espectro ideológico da Câmara dos Deputados, a novidade foi a assunção e o crescimento da direita, com 209 deputados. As demais forças são: a centro-direita, com 94 deputados; o centro, com 75, a centro-esquerda, com 60 e a esquerda, com 75. No Senado, a maior presença é das forças de centro, com 29 senadores, seguido da direita, com 22, da centro-direita, com 13, da esquerda, com 11 e da centro-esquerda com 6. Outros levantamentos apontam crescimento da direita no Congresso da ordem de 30%, alcançando 301 deputados e 41 senadores a partir de 2019.
Em relação ao perfil socioeconômico, a nova Câmara dos Deputados terá predominância de profissionais liberais e empresários, algo como 2/3 da Casa, e 1/3 dividido entre assalariados e atividades de natureza diversa. Em termos numéricos, próximo de 200 são profissionais liberais, algo como 150 são empresários e aproximadamente 160 são assalariados e ocupantes de atividades diversas.
Do ponto de vista das bancadas informais, a correlação de forças é muito desfavorável à área social, aos direitos humanos, ao meio ambiente e aos trabalhadores. A bancada sindical, por exemplo, teve redução de aproximadamente 20 integrantes, enquanto as bancadas conservadoras, mesmo tendo perdido alguns integrantes, como a ruralista e a evangélica, vêm fortalecidas, tanto pelo fato de suas pautas terem sido apoiadas por um dos candidatos à Presidência da República, quanto pela razão de que a bancada da segurança ou da bala cresceu e a bancada empresarial se manteve grande.
A nova correlação de forças, como se vê, é bastante desfavorável. Isto significa que os partidos de esquerda e centro-esquerda com representação no Congresso terão enorme desafio para conter as tentativas de retrocessos no papel do Estado, na condução da economia, na gestão pública e na defesa dos direitos humanos, dos direitos dos trabalhadores, púbicos e privados, da Previdência Social e dos programas sociais.
(*) Jornalista, analista político e diretor de Documentação do Diap. Texto publicado originalmente na revista eletrônica “Teoria & Debate”
Antônio Augusto de Queiroz*
A eleição do último dia 7 de outubro renovou em 52% a Câmara e 85% o Senado. O novo Congresso Nacional será mais liberal na economia, mais conservador nos costumes e mais atrasado em relação aos direitos humanos e ao meio ambiente do que o atual. Organizado em torno de bancadas informais — como as evangélicas, a da segurança/bala e a ruralista — será o mais conservador desde a redemocratização.
Neste pleito, a rejeição ao sistema político e às suas práticas foi devastadora. Mesmo os deputados e senadores tendo elaborado regras para assegurar suas reeleições — como a janela partidária, o fundo eleitoral e a redução do tempo de campanha e de propaganda eleitoral — a onda da renovação foi avassaladora.
Em que pese se reconhecer que o novo Congresso foi o mais renovado dos últimos 20 anos e que terá mais jovens, mais mulheres, mais negros, mais parlamentares conectados às redes sociais, terá mais estreantes ou em 1º mandato no Poder Legislativo Federal e será mais instruído que os anteriores, pode-se afirmar, com segurança, que será o mais conservador dos últimos 40 anos.
A renovação, como regra, é saudável, porque a alternância no poder é um dos principais pilares da democracia. Entretanto, como a motivação dessa renovação foi mais de rejeição aos atuais detentores de mandatos (bons e ruins) e menos de substituição qualitativa — com escolhas baseadas em critérios, propostas, trajetórias política e profissional dos candidatos — há sérias dúvidas sobre a qualidade dos eleitos. Apenas para ilustrar essa preocupação, basta dizer que a maioria absoluta dos novos foi eleita por ser liderança evangélica, policial linha dura, celebridade ou parente de políticos tradicionais. Ademais, foram eleitos alguns expoentes da “nova direita”, cujo único cabedal é terem liderado movimentos antipolítica, negando a validade do próprio sistema político-eleitoral.
Talvez o fato de a eleição ter se dado num ambiente conflagrado, a renovação tenha deixado muito a desejar em termos qualitativos, embora tenha sido grande do ponto de vista quantitativo. Muitos dos “novos” não têm a menor noção do que são, o que fazem e como funcionam as instituições do Estado. Boa parte imagina utilizar o mandato para se vingar do que, equivocadamente, consideram os inimigos da família, da pátria e da probidade, ou para defender o Estado mínimo.
A Câmara em números
Em termos numéricos, dos 513 deputados eleitos em 7 de outubro de 2018, 269 são novos ou não estavam no exercício do mandato, 244 foram reeleitos e 253 irão exercer seu 1º mandato na Câmara dos Deputados. Dos 407 deputados que tentaram a reeleição, 163 não lograram êxito, tendo sido derrotados. Dos 269 considerados “novos”, 128 já têm experiência anterior como agente político — eleito ou nomeado para função de confiança — e 141 nunca exerceram nenhuma função política anterior.
No Senado, o fenômeno foi ainda mais intenso. Dos 54 senadores em final de mandato, apenas 8 conseguiram renovar seus mandatos; 46 serão novos ou não estavam no exercício do mandato. Desses, pelo menos 9 nunca exerceram nenhum cargo político, nem no Executivo nem no Legislativo.
Quanto ao espectro ideológico da Câmara dos Deputados, a novidade foi a assunção e o crescimento da direita, com 209 deputados. As demais forças são: a centro-direita, com 94 deputados; o centro, com 75, a centro-esquerda, com 60 e a esquerda, com 75. No Senado, a maior presença é das forças de centro, com 29 senadores, seguido da direita, com 22, da centro-direita, com 13, da esquerda, com 11 e da centro-esquerda com 6. Outros levantamentos apontam crescimento da direita no Congresso da ordem de 30%, alcançando 301 deputados e 41 senadores a partir de 2019.
Em relação ao perfil socioeconômico, a nova Câmara dos Deputados terá predominância de profissionais liberais e empresários, algo como 2/3 da Casa, e 1/3 dividido entre assalariados e atividades de natureza diversa. Em termos numéricos, próximo de 200 são profissionais liberais, algo como 150 são empresários e aproximadamente 160 são assalariados e ocupantes de atividades diversas.
Do ponto de vista das bancadas informais, a correlação de forças é muito desfavorável à área social, aos direitos humanos, ao meio ambiente e aos trabalhadores. A bancada sindical, por exemplo, teve redução de aproximadamente 20 integrantes, enquanto as bancadas conservadoras, mesmo tendo perdido alguns integrantes, como a ruralista e a evangélica, vêm fortalecidas, tanto pelo fato de suas pautas terem sido apoiadas por um dos candidatos à Presidência da República, quanto pela razão de que a bancada da segurança ou da bala cresceu e a bancada empresarial se manteve grande.
A nova correlação de forças, como se vê, é bastante desfavorável. Isto significa que os partidos de esquerda e centro-esquerda com representação no Congresso terão enorme desafio para conter as tentativas de retrocessos no papel do Estado, na condução da economia, na gestão pública e na defesa dos direitos humanos, dos direitos dos trabalhadores, púbicos e privados, da Previdência Social e dos programas sociais.
(*) Jornalista, analista político e diretor de Documentação do Diap. Texto publicado originalmente na revista eletrônica “Teoria & Debate”
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