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Medicina indígena indica chás e xaropes caseiros contra Covid-19

Medicina
Remédios são voltados para tratar os sintomas da doença. Um deles, o xarope de limão e alho, você provavelmente já conhece. Confira as outras receitas!

Manaus - A chamada 'medicina ocidental' ainda não encontrou remédios comprovadamente eficazes para curar ou tratar o novo coronavírus. No entanto, a medicina indígena milenar já tem suas próprias orientações para prevenir e até diminuir os efeitos da Covid-19. O conhecimento é baseado nos ensinamentos passados de geração em geração e os tratamentos focam no bem-estar do corpo e espírito.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), há 305 povos indígenas que habitam o País. Cada etnia possui sua própria cultura, o que faz com que a maioria deles tenham diferentes visões sobre doenças e processos de cura. Para esta reportagem, o EM TEMPO conversou com indígenas do povo Sateré Mawé e Tukano.

Chás

A primeira a dar dicas sobre receitas de remédios tradicionais é Regina Sateré, liderança indígena da Associação de Mulheres Indígenas Sateré Mawé, com sede em Manaus. Com diferentes chás, ela conta ter diminuído os sintomas da Covid-19 em seus parentes.

"Na primeira onda do coronavírus, nós nos tratamos com chá de folha de amora, de goiabeira, unha de gato e folha de caapeba. Todos nós tomamos com os ingredientes bastante concentrados, por uns 20 dias, até nos recuperarmos", comenta Regina.


Chás vendidos no Centro de Medicina Indígena | Foto: Divulgação/Centro de Medicina Indígena da Amazônia

Veja abaixo, em lista, os benefícios associados a cada um dos chás citados, todos feitos com as folhas das plantas. Quanto às propriedades, as informações são do site Tua Saúde e de Tatiana Zanin, nutricionista.

Amora (contraindicada para gestantes): com propriedades anti-inflamatórias e antioxidantes, as folhas atuam na redução das cólicas, diarreias e até infecções, porque também é antibacteriana. Como fazer: uma colher de chá das folhas para uma xícara de água fervente. Coar e tomar duas vezes ao dia.

Goiabeira: com sua ação antioxidante, o chá atua no estômago e intestino, aliviando dores, inflamações e diarreias. Atua também como relaxante, cicatrizante e anti-hemorrágico. Como fazer: uma colher de chá com folhas secas para uma xícara com água fervente. Coar e beber até três vezes por dia.

Unha de gato (contraindicada para gestantes, lactantes e autoimunes): melhora o sistema de imunidade do corpo e auxilia no tratamento de infecções e inflamações. Dentre os maus que pode combater estão a asma, rinite e virose, doenças com sintomas semelhantes aos da Covid-19. Como fazer: 20 gramas das raízes para um litro de água. Ferver por 15 minutos, deixar descansar por 10, e beber coado a cada oito horas.

Caapeba (contraindicada para gestantes): utilizada para tratar anemia, azia, dor de estômago, febre e resfriados. As folhas da planta têm ação diurética, febrífuga, anti-inflamatória, laxativa e sudorífera. Como fazer: 30 gramas da folha para 750 ml de água fervente. Beber três xícaras diariamente.

Regina diz que os chás são herança de sua avó Tereza Sateré, que fazia os remédios para tratar as doenças dos parentes.

"Lembrei que ela utilizava todas essas receitas para tratar gripe, que possui sintomas parecidos com os do coronavírus. E como essa nova doença não ataca só o pulmão, mas também rim, fígado e até o coração, nós tomamos esses chás. Eles são calmantes e ajudam no funcionamento dos órgãos", comenta a presidente da Associação de Mulheres Sateré Mawé.

Outras dicas

O chá de folha de caapeba indicado por Regina tem, entre suas propriedades, a função de aumentar o suor do corpo. Esse é um dos principais motivos pelos quais a indígena indica o tratamento.

"Quando se está com febre, um dos sintomas do coronavírus, é preciso suar. Por isso, além do chá, você deve colocar bastante roupa e não usar ar-condicionado. Nós fizemos isso aqui na associação", afirma Regina.

A indígena indica ainda um dos chás mais conhecidos pelos não indígenas, o de alho com limão e gengibre. O remédio ajuda a diminuir o cansaço físico e mental, além de eliminar toxinas do corpo. Tem também ação antibacteriana e anti-inflamatória, e diminui a dor de cabeça. Como fazer: deixe o gengibre em uma panela com água fervente (quantidade para uma xícara), por dez minutos. Após metade desse tempo, coloque três dentes de alho amassados. Por fim, esprema meio limão. Beba coado e morno.

Xaropes

Além dos tratamentos acima, xaropes caseiros também foram utilizados para combater a Covid-19. Segundo Clarice Tukano, presidente da Associação de Mulheres Indígenas do Alto Rio Negro.

"Um dos remédios mais comuns que as minhas colegas fazem aqui na associação é o xarope caseiro. Inclusive quando algumas delas vieram do interior para Manaus, trouxeram junto a mistura", comenta a liderança indígena.

Para fazer o xarope, raspe uma cebola ou bata em um liquidificador, retirando apenas o caldo que sobrar da planta. Para cada quantidade do suco, coloque a mesma de mel. Em seguida, esprema meio limão e deixe descansar por duas horas. Atenção: mel não é indicado para crianças menores de um ano.

"Esse xarope ajuda a combater pneumonia, aumenta a imunização e diminui as tosses e o catarro. E o melhor, é que, se não tiver mel, você pode fazer também com açúcar caramelizado", indica Clarice Tukano.

Origem da medicina indígena

Para além dos ingredientes e receitas tradicionais, existe ainda um ponto mais complexo sobre a medicina indígena. A falta de reconhecimento da experiência dos povos que lidam com o que a floresta oferece há muito tempo.

"Os povos indígenas, conforme descobertas arqueológicas, estão presentes nessa terra há 14 mil anos. Significa dizer que, em todo esse tempo, nós estamos manejando a floresta, o rio, desenvolvendo tecnologias de alimentação e saúde", comenta João Paulo Barreto Tukano, idealizador do Centro de Medicina Indígena da Amazônia, com sede em Manaus.

Além de professor e pesquisador, João Paulo Barreto Tukano é ativista indígena | Foto: Divulgação

Ele, que é doutorando em Antropologia na Universidade Federal do Amazonas (Ufam), explica como durante os 521 anos da colonização do Brasil, indígenas foram sistematicamente assassinados por doenças trazidas de outros continentes.

"Enquanto epidemia, o coronavírus não é novidade para os povos indígenas. Nós tivemos o sarampo, gripe, coqueluche e outras doenças que nos mataram, no passado", diz João.

Segundo o indígena, em todo esse processo, os povos tradicionais se fortaleceram com duas maneiras de cuidar da saúde. A primeira envolve a prática do bahsese [benzimento], feito apenas por pajés, e a segunda, de plantas medicinais fornecidas pela floresta.

"Esses tratamentos muitas vezes diminuíram as mortes causadas por essas epidemias, no passado. E posso dizer que o mesmo ocorreu durante a pandemia de covid-19. Nos locais mais distantes, onde a medicina ocidental não chegou, indígenas se trataram com seu próprio conhecimento", afirma o Tukano.

Doenças como consequência da maldade humana

A origem do novo coronavírus ainda é desconhecida, embora no início da pandemia tenha se espalhado que o patógeno poderia ter surgido de morcegos. Para João Paulo, no entanto, os povos indígenas já têm a resposta.

"Nossa concepção é que os humanos são formados por diferentes elementos que vão além do corpo físico. Cada um desses seres, que habitam ao nosso redor, vão atacar, se você mexer com eles. E é nesse contexto que vemos a exploração de madeira, a extinção de animais e outras degradações. Ou seja, para nós, indígenas, essa é a origem dessas doenças. O pior é que ainda culpam morcegos, porcos e outros seres por causa do surgimento do vírus. Para nós, é óbvio que se você construir uma relação de desequilíbrio com a natureza, é isso que vai ter, no final", comenta o indígena do povo Tukano.


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