Informatica

Folha e Intercept revelam como Moro fez boca de urna para eleger Bolsonaro

Nova reportagem da Folha, em parceria com o Intercept, nesta segunda-feira (29), mostram diálogos de procuradores da Lava Jato a seis dias da eleição presidencial de 2018. Eles revelam os bastidores da força-tarefa acerca da delação premiada do ex-ministro Antonio Palocci, cujo sigilo foi levantado pelo então juiz Sérgio Moro para prejudicar a candidatura de Fernando Haddad (PT) e beneficiar a de Jair Bolsonaro (PSL) –de quem já havia recebido convite para ser ministro da Justiça.

Compartilhe esta matéria

“Não deve o juiz atuar como guardião de segredos sombrios de agentes políticos suspeitos de corrupção”, justificou-se Moro ao ser cobrado pela boca de urna pró-Bolsonaro a menos de uma semana da eleição. “Retardar a publicidade do depoimento para depois das eleições poderia ser considerado tão inapropriado como a sua divulgação”, completou o “Russo”, como é chamado pelos procuradores de Curitiba nas mensagens do Telegram.

Ato contínuo à delação com a Polícia Federal homologada pelo TRF4 e à vitória de Bolsonaro, Palocci deixou a prisão no dia 29 de novembro de 2018 — ou seja, um mês após a eleição no segundo turno.

LEIA TAMBÉM
Luiz Fernando Pereira: jornalista pode divulgar material sem revelar a fonte




Advogados de “hacker” desmentem apelido Vermelho e pagamentos por mensagens

PSOL condena ataque de garimpeiros aos índios Waiãpi

Haddad: ‘Deltan vendia informações privilegiadas para bancos’

A reportagem da Folha e do Intercept, assinada pelos jornalistas Ricardo Balthazar e Rafael Moro Martins, detalha que os procuradores da força-tarefa resistiam à delação de Palocci à PF, mas, com a ajuda de Deltan Dallagnol, eles se renderam ao “Russo” que viu mais uma ocasião para ajudar seu candidato e futuro chefe Jair Bolsonaro.




O jogo do Ministério Público Federal do Paraná para prejudicar os petistas nas vésperas da eleição foi exaustivamente denunciado aqui pelo Blog do Esmael, principalmente a três dias da votação do primeiro turno.

A delação sem provas de Palocci versava sobre um suposto do apoio da empreiteira Odebrecht ao Instituto Lula, em que o ex-presidente e o ex-ministro são réus. Palocci acusou as duas campanhas da ex-presidenta Dilma Rousseff (PT), em 2010 e 2014, de receber mais de R$ 1,4 bilhão em caixa dois. Na época, ela desmentiu o ex-ministro em nota.

Abaixo, a reprodução de diálogos pelo Intercept:

16.mai.2017

Sérgio Bruno Cabral Fernandes

17:42:31 Pessoal, eu e Fernando atendemos aqui hoje os advogados Bretas, Tracy, Joseph e Reinaldet.

Eles vieram aqui tratar de um assunto na ACrim e pediram pra serem atendidos. Não estava marcado. Vieram comunicar que foram contratados pelo Paloffi e que pretendem apresentar anexos em breve. Destacaram alguns anexos que serão apresentados, os quais pareceram promissores.

Paulo Roberto Galvão

17:42:52 destacaram p vcs alguma coisa com foro?

Sérgio Bruno

17:44:53 Disseram que virá pelo menos um Senador, um Deputado e um governador. Mas não disserem os nomes. O governador acho que é o Pimentel.

Paulo

17:45:14 buenas

Anônimo

17:47:24 Creio que precisamos trabalhar a extração de anexos com muito cuidado, pois a crença geral é que o Palocci sabe muita coisa. Assim, o melhor é fazermos um filtro criterioso para não sermos usados por ele. Ele já mostou que é perigoso.

CITAÇÕES

Bretas, Tracy, Joseph e Reinaldet Adriano Bretas e Tracy Joseph Reinaldet, advogados de Palocci

ACrim Divisão interna da Procuradoria-Geral da República

Paloffi Antonio Palocci

Pimentel o então governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT)

Anônimo procurador não identificado no material obtido pelo Intercept

De acordo com as mensagens obtidas pelo Intercept, os procuradores se reuniram com os advogados de Palocci pelo menos 14 vezes, em Brasília e Curitiba, entre maio de 2017 e janeiro de 2018. Depois de quatro meses de negociações, havia insatisfação com as provas apresentadas por Palocci.

22.set.2017

Antônio Carlos Welter

12:06:00 Meus caros, Estamos conversando com o Palocci e seus advogados há alguns meses já. Tivemos um início um pouco penoso, até que a coisa parece ter engrenado. A colaboração dele pode ser muito útil, sobretudo porque ele esteve ou no governo ou muito próximo por cerca de 14 anos. Traz aspectos interessantes, como anexos relativos a fundos de pensões, CARF e outros conselhos, além de BACEN, instituições financeiras e outros órgãos em relação aos quais temos (em Curitiba) pouca ou nenhuma informação. Os anexos ainda precisam ser melhorados, seja no que diz respeito a conteúdo, seja aos elementos de corroboração, que em alguns casos são poucos. Diria que o diálogo já avançou muito e ele tem trazido aspectos muito interessantes. Tem ainda potencial para esclarecer a parte patrimonial de vários dos investigados, especialmente aqueles ligados ao PT. Nossa avaliação é que podemos ter um bom resultado, desde que trabalhemos em conjunto e com calma e tempo, já que o candidato a colaborador é uma pessoa extremamente inteligente.

CITAÇÕES

Carf Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, do Ministério da Economia

Bacen Banco Central

Sem avanços significativos após oito meses de conversas, a Procuradoria-Geral da República cobrou uma definição da força-tarefa de Curitiba no início de 2018. Os procuradores voltaram a conversar com os advogados de Palocci e concluíram que não havia mais motivo para insistir nas negociações.

18.jan.2018

Welter

11:16:09 Alfredo e demais colegas, Os advogados do Paloci tem reunião com vocês hoje à tarde. Ontem estiveram aqui e deixaram uma nova versão dos anexos, com alguns acréscimos, que seguem abaixo. Já sabemos das conclusões do grupo da PGR sobre o acordo, mas encaminho os anexos para análise, de qualquer modo. Na próxima semana teremos nossa reunião aqui, quando definiremos nossa posição também. Abc e boa reunião

11:16:48 680141.docx

José Alfredo de Paula Silva

11:30:43 Welter, nesse caso Palocci, a avaliação de vcs é prejudicial. Se vcs tiverem interesse no acordo, analiso esses anexos. Se não tiverem, podem já encerrar. Me avisem, portanto. Direi isso aos advogados hoje.

Welter

11:40:06 ainda não temos convicção sobre o assunto. Mas estamos caminhando para

uma decisão negativa, já que os anexos estão demorando muito a melhorar. Pensamos numa entrevista com o candidato, colocando de modo claro que ou ele melhora, ou vai cumprir pena

José Alfredo

14:47:55 Advogados avisados. Se vc disser não, acabou. Se disser sim, ou faremos juntos (PGR e Curitiba) ou só Curitiba após despacho de cisão.

Welter

15:39:28 Beleza

CITAÇÕES

PGR Procuradoria-Geral da República

25.jan.2018

Welter

17:30:57 Alfredo Fizemos uma reunião aqui – CF, Januário, Laura e eu – e definimos que como os anexos estão sem elementos de corroboração suficientes, decidimos romper as negociações. Avisamos os advogados que vão comunicar o cliente deles

José Alfredo

18:13:06 Ótimo. Página virada.

CITAÇÕES

CF o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima

Januário o procurador Januário Paludo

Laura a procuradora Laura Tessler

Palocci fechou então acordo com a Polícia Federal, e ele foi homologado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Nos grupos do Telegram, os procuradores continuavam críticos à delação. Segundo um deles, o então juiz Sergio Moro também tinha dúvidas sobre as provas entregues por Palocci.

25.set.2018

Paulo

19:21:19 Russo comentou que embora seja difícil provar ele é o único que quebrou a omerta petista

Laura Tessler

19:24:06 Não só é difícil provar, como é impossível extrair algo da delação dele… padrão Delcidio

Welter

19:31:18 o melhor é que fala até daquilo que ele acha que pode ser que talvez seja. Não que talvez naõ fosse.

CITAÇÕES

Russo Apelido usado pelos procuradores para se referir a Moro

Omertà O código de honra dos mafiosos italianos

Delcidio O ex-senador petista Delcídio do Amaral, que fez acordo de delação premiada em fevereiro de 2016

Em 1º de outubro de 2018, a seis dias da eleição presidencial, Moro tornou públicos os termos da delação de Palocci e um dos seus depoimentos, anexando os documentos aos autos de uma ação da Lava Jato. Houve desconforto entre os procuradores, que voltaram a criticar o acordo no Telegram.

3.out.2018

Jerusa Viecili

10:51:55 Dúvida: vamos fazer uso da delação do palocci? Isso foi discutido?

Januário Paludo

10:52:44 O que palocci trouxe parece que está no Google.

Jerusa

10:52:59 Fazer uso Significa Aceitar o acordo da PF

[…]

Deltan Dallagnol

11:01:38 Explica melhor Je? Vc cogitaria não usar? Feito o acordo, creio que temos que tentar extrair o melhor dele e lutar para ele não receber benefícios diante da improbabilidade de que haja resultados úteis. Contudo, não me parece em uma primeira reflexão boa a estratégia de negar valor sem diligências. Essa foi a estratégia da PF na discussão pública sobre o acordo da Odebrecht, que me pareceu indevida (ressalvadas as distinções óbvias com o acordo da Ode)

[…]

Jerusa

11:02:41 perguntei pq foi comentado, antes, que nao usariamos. foi ao menos isso que me falaram com relacao aos termos de belo monte. ou seja, a ideia nao é minha.

11:03:15 sem falar que os relatos dele sao muito ruins

[…]

11:03:36 e que ficou de fazer diligencias para corroborar os fatos foi a PF. Isso foi feito?

11:03:53 salvo engano, welter e laura, que estavam cuidando do caso.

[…]

Deltan

11:05:19 encerrou o prazo agora, mas creio que era prazo pro Palocci trazer provas de corroboração. Deve ter mta notícia do goolge lá rs

[…]

Laura

21:09:42 Muitas mensagens… li rapidamente algumas…questão do acordo do Palocci: nossa ideia era não usar por enquanto, para não dar força para o acordo. O acordo é um lixo, não fala nada de bom (pior que anexos Google). Gebran pediu para nos manifestarmos e vamos dar uma retomada nos anexos e nas supostas corroborações

[…]

21:13:03 Se o acordo ganhar força, vão querer aplica-lo para reduzir a pena do Palocci na apelação do caso no qual já foi condenado (bizarro e absurdo)

Isabel Grobba

21:15:10 Laura, não tivemos prazo adicional. Então depois mando para você e Welter mensagem específica a respeito amanhã.

Deltan

21:15:59 Entendo, mas a mim parece que se ganhar força com fatos relevantes é melhor, ainda que ele seja beneficiado contra nosso parecer (o que vai acontecer provavelmente de qq modo)…

21:16:14 Valeu Laurinha pelas demais infos tb

CITAÇÕES

Odebrecht acordo fechado em 2016 e criticado pela PF

Belo Monte a hidrelétrica de Belo Monte, um dos assuntos da delação de Palocci

Gebran o juiz federal João Pedro Gebran Neto, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que homologou a delação

Mensagens sobre outros assuntos discutidos em 3.out.2018 foram suprimidas em benefício do entendimento dos diálogos sobre Palocci

A transcrição das mensagens manteve a grafia original dos arquivos obtidos pelo The Intercept Brasil

Extraido do Blog do Esmael

Comentários