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Fogo amigo pode ter ferido delegado Rilmar Firmino.

O crime do qual foi vítima o delegado geral da Polícia Civil do Pará, Rilmar Firmino de Sousa, baleado em tentativa de assalto na esquina da rua dos Mundurucus com a avenida Generalíssimo Deodoro, no bairro da Cremação, segue rendendo inesperados capítulos.

No dia do crime, testemunhas e porta-vozes da polícia correram à imprensa para dizer que o “chefe de polícia” estava fazendo rondas nas delegacias e seccionais de Belém quando foi vítima de uma tentativa de assalto, e que teria sido baleado por um dos assaltantes. Porém, o DIÁRIO teve acesso a depoimentos prestados na Divisão de Homicídios - que apura o crime - que dão novos contornos ao caso. Eles revelam não só a dinâmica da ação dos assaltantes, mas também expõem inesperadas contradições frente aos laudos do Instituto de Criminalística.

DIÁRIO acessou laudo e depoimentos que desmentem a versão do baleamento do delegado-geral da Polícia Civil (Foto: Divulgação)

ANTES DO "BOTE"

Um vigilante que estava de serviço no momento do crime conta que viu Anderson Gonçalves de Jesus, o “Doque”, em um mototáxi, chegar a uma vila onde tem parentes. Lá, “Doque” se encontrou com a namorada, tendo saído na contramão pela rua dos Pariquis e em seguida retornou encontrando o também assaltante “Cérebro”. Os dois são assaltantes contumazes na prática de crimes no bairro.


Após um rápido contato, os dois saíram e se postaram na esquina da rua dos Mundurucus com a avenida Generalíssimo Deodoro, sendo que “Doque” fingia estar urinando em um poste. Edvan, o “Cérebro”, ficou em frente a uma panificadora quando um veículo preto parou no sinal.

A testemunha diz que Anderson saiu de trás do poste partindo para cima do veículo com uma arma em punho mandando que o motorista abaixasse o vidro lateral enquanto batia com a coronha no parabrisa. “Neste momento, ouvi vários disparos e vi Anderson caído na calçada e mesmo assim continuou atirando no veículo”.

Com a abertura do sinal, o veículo preto seguiu em baixa velocidade pela rua dos Mundurucus e logo em seguida a namorada de Anderson, identificada pela polícia como Brenda Mayara Brito de Oliveira, chegou em uma motocicleta socorrendo o ferido, enquanto “Cérebro” fugiu para a vila em uma bicicleta. A testemunha ainda afirma que não foi possível ver com quem ficou a arma utilizada por Anderson, e que deve ter sido levada por familiares que moram na vila e correram em socorro ao assaltante.

PASSAGEIRA

Ouvida pelo delegado Gilvandro Furtado, da Divisão de Homicídios, a capitã da Polícia Militar Simone Franceska Pinheiro das Chagas disse que é lotada no gabinete do comandante geral da PM e que na noite do crime se encontrava em missão policial face à greve dos policiais civis, acompanhando o delegado geral Rilmar Firmino, quando aconteceu o fato.

A capitã disse que, após reduzir a velocidade na esquina da rua dos Mundurucus com a Generalíssimo Deodoro, surgiram dois elementos -um pela direita e outro pela esquerda - sendo que este último estava armado de um revólver batendo no parabrisa dianteiro, passando em seguida para a lateral, e efetuou vários disparos na direção do delegado Rilmar Firmino. Um disparo, diz a capitã, acertou Firmino, enquanto o revide do policial acertou também um tiro no assaltante.

Simone Franceska disse que, mesmo ferido, o delegado conseguiu dirigir até o PSM da 14 de Março e que, quando era transferido para o Hospital Metropolitano, a policial reconheceu Anderson Gonçalves de Jesus, que chegava ferido para receber atendimento médico no PSM - sendo solicitado apoio do tenente Sullivan, que prendeu tanto Anderson de Jesus como a namorada, Brenda Mayara Brito de Oliveira. Dois dias depois, a família do segundo envolvido no crime, Edvan Luan dos Santos Reis, 23 anos, o “Cérebro”, o apresentou à delegada geral interina, Christiane Ferreira. Ele foi levado à Divisão de Homicídios, onde também prestou depoimento no volumoso inquérito policial presidido pelo delegado Gilvandro Furtado.

EM SERVIÇO?

Anderson Gonçalves de Jesus recebeu alta do Hospital Metropolitano de Ananindeua e foi transferido imediatamente para um presídio em Americano, onde espera uma posição da justiça. Familiares do mesmo foram aconselhados a entregar a arma utilizada no assalto, que poderia também auxiliar no imbróglio cheio de contradições que cerca o rumoroso caso envolvendo o delegado Rilmar Firmino.

Até hoje ninguém da cúpula da segurança pública veio desmentir os boatos que circularam nas redes sociais dias depois do evento criminoso, dando conta que o delegado Rilmar Firmino estaria em uma atividade festiva na Cidade Velha, e não fazendo rondas nas delegacias, como informou em seu depoimento a capitã Simone Franceska.

Policiais civis ligados ao sindicato da categoria estiveram em todas as seccionais e delegacias da capital e foram informados pelos plantonistas que o delegado Firmino não esteve em nenhuma delas na noite em que aconteceu a tentativa de assalto.

Policiais consultados pelo DIÁRIO afirmam que rondas em delegacias são funções do delegado rondante da Corregedoria da Polícia Civil, e sempre com uma guarnição completa: motorista policial, investigador, escrivão e delegado - não necessariamente o delegado-geral, que tem função administrativa.

Perfurações no veículo são de pistola automática

Duas perícias foram realizadas pelo Instituto de Criminalística a pedido do presidente do inquérito policial. A primeira denominada de “Levantamento de Local sem Cadáver”, realizada por dois peritos do IML, tinha como objetivo principal coletar e analisar vestígios de interesse criminalístico para esclarecer o crime.

Os peritos constataram que o trânsito livre de terceiros e o fluxo de veículos na cena do crime destruíram importantes evidências e prejudicaram a coleta de provas materiais.


Uma das balas da troca de tiros que atingiu o delegado Firmino. Um único disparo foi dado pelo assaltante Anderson e não perfurou a lataria (Foto: Divulgação)

Diante desta situação, os peritos que assinam o laudo concluíram que havia manchas de sangue humano decorrentes de uma ação violenta que resultou no ferimento de uma pessoa até então não identificada. No entanto, os peritos não encontraram elementos para designar o tipo de arma empregada na situação.

A segunda perícia foi realizada no veículo utilizado pelo delegado Rilmar Firmino, um Voyage preto, placa OSW-9197 ano 2013. Após ouvir testemunhas, os dois peritos informaram que o delegado foi abordado pelo lado esquerdo e reagiu. No entanto, os peritos observaram que no mesmo veículo havia uma segunda pessoa que também atirou contra o assaltante.

Ressalta-se que a segunda pessoa, a capitã Simone Franceska, em seu depoimento, disse que apenas o delegado Rilmar Firmino teria atirado contra Anderson de Jesus. No entanto, para a perícia, esta pessoa esticou o braço para o lado de fora do carro e posicionou a mão por sobre o teto, desferindo alguns disparos.

Ao iniciar a perícia, os homens do Instituto de Criminalística constataram que não foram tomadas medidas de isolamento e preservação do veículo para o trabalho de perícia, o que tornou o local inidôneo.

Apesar disso, os peritos conseguiram observar quatro perfurações transfixantes no teto do carro do delegado geral, no sentido de fora para dentro, sendo os disparos constantes e próximos, sugerindo ser de uma pistola automática.

Os peritos informam no laudo que o DIÁRIO obteve com exclusividade que “a pessoa ocupante do assento do carona deflagrou os disparos com a mão apoiada por sobre o teto do veículo”, e os tiros foram dados da direita para a esquerda, no sentido inverso da abordagem do assaltante.

Considerando o veículo em movimento no momento do assalto, os peritos afirmam que o primeiro disparo no teto é o ponto de perfuração mais próximo do vidro pára-brisa dianteiro e o último disparo foi o ponto mais próximo do vidro traseiro, sendo que na porta do motorista os peritos constataram um ponto no sentido de disparo da esquerda para a direita.

Os peritos também localizaram uma garrafa plástica abaixo do assento do motorista de uma bebida com o rótulo “Energy Drink – Freepower” e recolheram várias peças balísticas e vestígios de sangue certamente do delegado Rilmar Firmino - ferido na tentativa de assalto.

Tiro de assaltante não poderia ter atingido Firmino

O laudo faz uma revelação que tinha sido difundida muito antes de se conhecer o laudo pericial. No item 7.2.5 do laudo, os peritos constataram que, após uma análise mais apurada o disparo que atingiu a porta ao lado do assento do motorista, no caso o delegado Rilmar Firmino, foi deflagrado por uma arma de fogo empunhada por uma pessoa dentro do veículo, no caso a capitã Simone Franceska.

Os peritos fazem uma observação importante: a hipótese do tiro que acertou o delegado Rilmar Firmino ter sido desferido pelo assaltante Anderson Gonçalves de Jesus, posicionado no lado de fora do carro, é praticamente “nula”. Após análise minuciosa dos disparos de arma de fogo, se conclui que o sentido dos disparos foi da direita para a esquerda e de cima para baixo.

Os peritos encontraram um ponto de disparo da esquerda para a direita, que foi o único a atingir o carro do delegado Rilmar Firmino - e não transfixou. Pode-se afirmar que Anderson de Jesus disparou apenas um tiro e nem chegou a perfurar a lataria do carro.

FOGO AMIGO

Concluindo a perícia de mais de 30 páginas, os peritos afirmam que ação violenta envolveu emprego de arma de fogo do tipo pistola ponto 40 - cujos disparos ocorreram no sentido da direita para a esquerda de cima para baixo, que culminou com o baleamento do delegado geral da Polícia Civil do Pará Rilmar Firmino de Sousa, conforme laudo de lesão corporal expedido pela médica legista Josefa Bentes.

(Diário do Pará)

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