*ARTHUR VIRGÍLIO
Lisboa – Após quase um ano em Portugal, servindo na Embaixada Brasileira como seu Conselheiro Político, preparo, para o mês de março, meu retorno ao Brasil. Saio deste país agradecido pela hospitalidade dos seus filhos, pela grandeza de sua civilização e pelo acréscimo que me proporcionou ao meu acúmulo de conhecimento.
Saio daqui preocupado com a crise profunda, econômica e social, que corta a gordura de poucos e atinge os ossos de muitos. O sentimento que me invade é de profunda solidariedade, torcendo para que o governo Passos Coelho consiga levar a bom termo sua gigantesca luta contra dificuldades que parecem intransponíveis. Confio em que a história lusa falará mais alto e, dentro de alguns anos, teremos uma economia ajustada fiscalmente, a crise social dissipada, o crescimento retomado em moldes sustentáveis. Confio em que investimentos em inovação serão feitos e a produtividade econômica crescerá a ponto de viabilizar as exportações que, hoje, estão estranguladas.
Passei a amar Portugal e sua gente. Nunca mais deixarei de olhar para este belo cantinho do mundo sem que meu coração se deixe invadir pela ternura e pela saudade.
É um grande país, como Lisboa é notável cidade. A vida que tenho levado é que não é a minha. Daí momentos depressivos que vivi, entremeados por outros de deleite puro.
Meu destino é a vida pública, disputando eleições. Somente o concurso público para a carreira diplomática não envolveu a chancela popular em minha trajetória. Exigiu estudos febris e muita disciplina, abrindo a perspectiva de bela carreira que deixei de lado para servir, pela via da política com "P" maiúsculo, ao meu estado e ao meu país.
Três vezes deputado federal, prefeito de Manaus, senador por oito anos, é verdade que, durante esses 24 anos de mandato popular, ocupei alguns postos que não derivaram do voto popular: vice-líder do PMDB que enfrentava a ditadura, aquele de Ulysses Guimarães e Tancredo Neves, bem diferente do atual; vice-líder do PSDB e seu Secretário-Geral nacional, entre 1995 e 1998; líder do governo Fernando Henrique, Ministro-Chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República e novamente líder, entre 1999 e 2002; líder do PSDB no Senado de 2003 a 2010.
Alguém poderia dizer que todos esses cargos, nos quais entrei e dos quais sai cercado de respeito da imprensa e da opinião pública do Amazonas e do Brasil, não derivaram do voto do povo. Eu responderia que derivaram sim. Indiretamente, mas derivaram. Afinal, não houvessem os amazonenses confiado em mim em tantas eleições, eu não poderia ter sido convocado para cumprir nenhuma dessas elevadas missões.
Meu destino, repito, sempre será decidido no cotejo das ideias e no julgamento soberano dos amazonenses. A diplomacia é uma grande carreira, mas não é a minha vocação, não me realiza, não me faz plenamente feliz. Com a luta política, dá-se o contrário. Ela me renova, me fortalece, me faz indômito.
Mesmo acontecimentos lamentáveis, extralegais e extrapovo, como os registrados no último pleito para o Senado, são insuficientes para abater um ânimo que nasceu para renascer como a Fênix, uma, duas, mil vezes. As ruas me dizem do seu sentimento e até da sua dor, do seu desamparo e até da sua saudade. Saudade que é minha também e que, com certeza, não durará para sempre.
Um experiente político e pensador nordestino costuma proclamar: "em política, ninguém mata, ninguém morre". Sábia lição para os prepotentes, que, montados no poder econômico e na máquina pública, confundem a ilusão que vendem com apelo real ao coração das pessoas.
Sigo em frente. Nenhum lugar mais propício do que Lisboa, do que Portugal, berços dos grandes navegadores para repetir Pessoa: "el rey mandou navegar e não morrer".
Recusei convites para disputar eleições pelo Rio de Janeiro (Prefeitura e Senado) e pelo Distrito Federal (Governo), este em 2014, diante do quadro estarrecedor de incompetência e corrupção que lá viceja. Até para presidir meu time do coração, o Flamengo, a oposição à atual dirigente, liderada pelo querido Marcio Braga, acha que sirvo.
Muito honrado com todas essas demonstrações de confiança e apreço, repeti mil vezes o mais gentil e delicado NÃO que pudesse sair do meu sentimento. Quem me julga no voto é o povo do Amazonas, se eu quiser me candidatar a algum cargo eletivo. Nenhum outro povo mais.
Essa decisão, eu a tomei em 1978, quando deixei a diplomacia (início de carreira) para disputar meu primeiro pleito junto ao meu povo. Destino é uma coisa forte. O meu, por exemplo, está teimosamente amarrado à paixão que meu estado, cheio de problemas e deficiências, desperta em todas as fibras do meu ser. Teimosamente atado ao sofrimento dos habitantes do interior, tão sós, tão valentes, tão sofridos, tão resistentes. Teimosamente jungido aos humores dessa Manaus que é uma mulher brejeira, envolvente, às vezes volúvel, que possui o condão de me por aos seus pés.
Estou voltando. Com a mesma cabeça erguida de sempre. As mesmas mãos limpas. A mesma coerência, que me impede a genuflexão diante dos poderosos.
Mais do que nunca apaixonado. Mais do que nunca a dar a minha vida pela vida de uma gente que me deu tantas oportunidades de servi-la e honrá-la.
*Diplomata escreve semanalmente neste blog
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