Há relatos de revoada dessa espécie em diversas áreas verdes da capital, dentre as quais a do Museu da Amazônia (Musa), no bairro Cidade de Deus, da Universidade Federal do Amazonas (Ufam)
Sem aparecer há pelo menos dez anos em Manaus, as araras-canindé (de cores azul, amarelo e preto) voltaram a ser vistas este ano na cidade. Há relatos de revoada dessa espécie em diversas áreas verdes da capital, dentre as quais a do Museu da Amazônia (Musa), no bairro Cidade de Deus, da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) e do conjunto Acariquara, no Coroado, além do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), no Adrianópolis.
O veterinário Anselmo D’Affonseca contou que viu um casal de araras-canindé com um filhote na mata do Inpa e há três semanas viu um bando com aproximadamente 42 araras-canindé passar pelos céus do Musa. De acordo com ele, que fotografou essa espécie de arara numa reserva do Inpa, na BR-174, e em Balbina, em Presidente Figueiredo, nunca tinha visto essas araras em Manaus. “Foi uma surpresa porque pela primeira vez vi araras-canindé voando na cidade”, afirmou.
Conforme o jardineiro Naldo Silva, 30, houve muita revoada de araras-canindé na floresta do conjunto Acariquara. Ele relata que elas apareciam de manhã cedo e no final da tarde. Agora, elas continuam indo ao local, mas em menor quantidade. “Antes vinham mais e tanto araras vermelhas quanto azuis. Elas faziam muito barulho quando estavam comendo frutos dos açaizeiros e das azeitoneiras. Atualmente elas continuam aparecendo, mas em bando pequeno”, disse.
A bióloga Aline Ramos dos Santos viu araras-canindé na Área de Proteção Ambiental (APA) da Ufam. Ela disse que ficou surpresa com a quantidade de araras por perto, nessa época, tanto no conjunto Acariquara quanto na Ufam. “Elas estão muito presentes agora. Acho que nunca vi tanta arara, com tanta frequência, como nos últimos dias! Além do ‘ressurgimento’ das canindés, de uma forma geral, está tendo mais araras na área. Qual será o motivo?”, questiona a bióloga.
De acordo com o pesquisador do Inpa Mário Cohn-Haft, as araras-canindé começaram a aparecer, em grande quantidade, em Manaus, em outubro deste ano. Ele disse que não da para saber o que trouxe essa espécie de arara, que não aparecia na cidade há pelo menos dez anos ou mais. “Esse é um evento misterioso. Não está claro se o que estimula é a abundância de alimento onde aparecem ou a escassez em seu lugar de origem ou as duas coisas juntas”, observou.
(Foto: Anselmo D’Affonseca/Divulgação)
Fenômeno semelhante com tucanos
e acordo com o pesquisador do Inpa Mário Cohn-Haft, essa não é a primeira vez que acontecem invasões esporádicas de aves atrás de comida em Manaus. Conforme ele, em 1989-1990 houve uma invasão de tucanos na cidade. Foi um movimento inédito como este que está sendo observado com as araras-canindé.
Periquitos apresentam comportamento sazonal no V8
O pesquisador do Inpa Mário Cohn-Haft comparou a revoada de araras-canindé com as dos periquitos nas palmeiras do condomínio Ephigênio Salles, na Zona Centro-Sul. Só que estes últimos decidiram voltar todos os anos.
“Eles ficaram comendo a safra de manga e dormindo no V8. Depois foram para a várzea para se reproduzir, mas voltaram nos anos seguintes. Agora passam seis meses na cidade e voltam para a várzea para reprodução. Alguns ainda ficam aqui na época do verão, mas a maioria dos 12 mil que dormem no V8 vão para a várzea para se reproduzir. Esse bicho tem super memória, sabe onde tem comida. É capaz de isso acontecer no próximo ano com as araras. Pode ser que ano que vem elas voltem de novo. Algumas para ver se têm recurso, se não tiver, farão só uma volta de reconhecimento e não vão ficar”.
Desmatamento, aterros e o fim dos buritizais
O pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) Mário Cohn-Haft afirmou que as araras-canindé deixaram de aparecer em Manaus há pelo menos dez anos. Conforme ele, os fatores que as fizeram serem ‘eliminadas’ da cidade foi o desmatamento de áreas verdes, aterro de igarapés e destruição de buritizais.
Conforme ele, as araras começaram a aparecer novamente em outubro e permanecem até agora. Mas elas não mantêm a rota perfeitamente previsível, estão indo onde tem comida. “Parece que aqui elas têm muita coisa para comerem tanto frutos de árvores frutíferas plantadas, como azeitoneira, quanto também de árvores nativas das nossas áreas verdes, como açaizeiro”, disse.
Ele ressalta que não se sabe o que causa as invasões esporádicas de aves, como a observada com as araras-canindé. “Esse evento é completamente desconhecido”, pontuou. “Mas muitas espécies de ave no mundo inteiro que dependem de comida, principalmente frutas, que podem ter safra boa ou ruim, tem tendência de seguir a disponibilidade de alimento”, completou.
Cohn-Haft conta que arara é um ‘bicho’ com vida longa, memória excelente e sociabilidade entre si pela troca de conhecimento. “Esse tipo de evento é mais provável acontecer com bichos que comunicam entre si informações sobre recurso. Um bicho desses voa longa distância atrás de comida. Pode ser até mesmo arara da cidade que foi embora e depois de muito tempo voltou porque sabe onde tem comida”.
Frase
“O que nos resta é o prazer de poder assistir um espetáculo tão bonito como esse de ver a revoada de araras-canindé. É um privilégio podermos observar esse evento especial que é tão incomum acontecer. É o tipo de coisa para contar para os nossos netos. Talvez eles cheguem a ver também”. Mário Cohn-Haft, pesquisador do Inpa
(Foto: Anselmo D’Affonseca/Divulgação)
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